A conduta de pessoal de um Papa é sempre perfeita? Não, já que o Papa, por mais santo que seja, é um homem mortal e sujeito a erros pessoais (saiba mais aqui). Ele é infalível somente quando ensina ex-cathedra. Esse fato dá aos católicos o direito de criticar o Papa publicamente, como se ele fosse um fulano qualquer? Não, realmente não!
O bispo de Roma é o pai do povo católico... você exporia as lacunas de seu pai ou de sua mãe de forma pública? Não acha que isso daria munição para seus inimigos rirem de você e de sua família? "Mas e se eu julgo que o Papa deu uma declaração confusa ou imprecisa, em uma entrevista? Não posso descer a lenha nele nas redes sociais?". Não, não pode!
Convenhamos, essa passagem não está na Bíblia só de enfeite: "Não toqueis nos meus ungidos" (Sl 104,15). Podemos até usar de uma fraqueza respeitosa, pontuando que talvez fosse melhor ele falar isso ou aquilo, que teria sido mais frutífero agir assim ou assado... Mas esculhambar o Papa é pecado!
A não ser que você seja, assim... um sujeito com a moral de um São Paulo. No livro dos Atos dos Apóstolos, afinal, vemos Paulo de Tarso jogando no ventilador a hipocrisia de São Pedro. Mas se não está ainda nesse nível de santidade paulina, é melhor morder a língua mil vezes antes de usá-la para atacar o bispo de Roma.
Todo católico tem a obrigação sagrada de amar o Papa. E como age um cristão que ama o Papa? Assim, ó:
# obedece o Papa e todas as coisas, não somente nas questões dogmáticas;
não fica discutindo de forma desrespeitosa as vontades do Papa;
não fica contrapondo a opinião do Papa à opinião de outras pessoas;
# não se atreve a limitar o campo onde o Papa pode e deve exercer sua autoridade.
# Tem muito católico aí que bate no peito se dizendo "tradicional", mas sua postura ácida contra o Papa o deixa muito mais próximo de um filho de Lutero! Assim, contribuem para o "escândalo dos bons e para a ruína das almas". Esse é o ensinamento de São Pio X. Seu discurso é voltado para os padres, mas certamente serve para os leigos também.
Papa São Pio X
Discurso aos Sacerdotes da União Apostólica
18 de novembro de 1912
O Papa é o guardião do dogma e da moral; é o depositário dos princípios que formam honestas as famílias, grandes as nações, santas as almas; é o conselheiro dos príncipes e dos povos; é a cabeça sob a qual ninguém deve sentir-se tiranizado, pois representa o próprio Deus; ele é o pai por excelência, que em si reúne tudo o que pode haver de amável, de terno, de divino.
Parece inacreditável, e é contudo doloroso, que haja padres aos quais se deve fazer esta recomendação, mas nos nossos dias nós estamos infelizmente nesta dura e triste condição de dever dizer a padres: Amai o Papa!
E como se deve amar o Papa? Não por palavras somente, mas por atos e com sinceridade. (...) E se Nosso Senhor Jesus Cristo dizia de si mesmo: “Se alguém me ama, guardará minha palavra”, assim, para mostrar nosso amor ao Papa, é necessário obedecer.
É por isso que, quando se ama o Papa, não se fica a discutir sobre o que ele manda ou exige, a procurar até onde vai o dever rigoroso da obediência, e a marcar o limite dessa obrigação. Quando se ama o Papa, não se objeta que ele não falou muito claramente, como se ele fosse obrigado a repetir diretamente no ouvido de cada um sua vontade e de exprimi-la não somente de viva voz, mas cada vez por cartas e outros documentos públicos.
Não se põem em dúvida suas ordens, sob fácil pretexto, para quem não quer obedecer, de que elas não vieram diretamente dele, mas dos que o rodeiam! Não se limita o campo onde ele pode e deve exercer sua autoridade; não se opõe à autoridade do Papa a de outras pessoas, por muito doutas que elas sejam, que diferem da opinião com o Papa. Por outra parte, seja qual for sua ciência, falta-lhes santidade, pois não poderia haver santidade onde há dissentimento com o Papa.
É o desabafo de um coração dolorido… para deplorar a conduta de tantos padres que, não somente se permitem discutir e criticar as vontades do Papa, mas que não têm a receio de chegar a atos de desobediência imprudente e atrevida, para grande escândalo dos bons e para a ruína das almas.
Em 1969, o futuro Papa Bento XVI, então Pe. Joseph Ratzinger, escreveu que criticar as declarações papais era não só possível mas até necessário, sempre que o Papa pudesse desviar-se do depósito da fé e da tradição apostólica. O Papa Bento XVI incluiu estas observações na antologia dos seus escritos, "Fede, ragione, verità e amore" de 2009. Tais observações, que agora publicamos abaixo traduzidas, são particularmente relevantes à luz da correção filial ao Papa Francisco:
«Devemos evitar especialmente a impressão de que o Papa (ou o ofício em geral) só pode reunir e expressar, de tempos em tempos, a média estatística da fé viva, para a qual não é possível uma decisão contrária a esses valores estatísticos médios (os quais, para além do mais, são problemáticos em sua verificabilidade).
A fé baseia-se nos dados objectivos da Escritura e do dogma, que nos tempos obscuros também podem desaparecer assustadoramente da consciência da maior parte do cristianismo (em termos estatísticos), sem perder de qualquer forma, contudo, o seu carácter obrigatório e vinculativo.
Neste caso, a palavra do Papa pode e deve certamente ir contra as estatísticas e contra o poder de uma opinião que pretende fortemente ser a única válida; e isso deve ser feito de forma tão decisiva quanto o testemunho da tradição é claro (como no caso apresentado). Pelo contrário, a crítica dos pronunciamentos papais será possível e até necessária quando carecem de fundamentação na Escritura e no Credo, isto é, na fé de toda a Igreja.
Quando não se tem o consenso de toda a Igreja, nem existem evidências claras das fontes, não é possível uma decisão vinculativa e definitiva. Se tal acontecesse formalmente, faltariam as condições para tal ato e, portanto, teria de ser levantada a questão quanto à sua legitimidade.» - Das neue Volk Gottes: Entwürfe zur Ekklesiologie, (Düsseldorf: Patmos, 1972) p. 144. Fede, ragione, verità e amore, (Lindau 2009), p. 400.
Como Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé e mais tarde como o Papa Bento XVI, Ratzinger continuou as suas reflexões sobre os limites do poder do Pontífice Romano para contrariar a imutável doutrina:
Cardeal Joseph Ratzinger, 1998:
O Romano Pontífice está como todos os fiéis submetido à Palavra de Deus, à fé católica e é garante da obediência da Igreja e, neste sentido, servus servorum. Ele não decide segundo o próprio arbítrio, mas dá voz à vontade do Senhor, que fala ao homem na Escritura vivida e interpretada pela Tradição; noutros termos, a episkopè do Primado tem os limites que procedem da lei divina e da inviolável constituição divina da Igreja, contida na Revelação. O Sucessor de Pedro é a rocha que, contra a arbitrariedade e o conformismo, garante uma rigorosa fidelidade à Palavra de Deus: daí resulta também o carácter martirológico do seu Primado.
Papa Bento XVI, 2005:
O poder conferido por Cristo a Pedro e aos seus sucessores é, em sentido absoluto, um mandato para servir. O poder de ensinar, na Igreja, obriga a um compromisso ao serviço da obediência à fé. O Papa não é um soberano absoluto, cujo pensar e querer são leis. Ao contrário: o ministério do Papa é garantia da obediência a Cristo e à Sua Palavra. Ele não deve proclamar as próprias ideias, mas vincular-se constantemente a si e à Igreja à obediência à Palavra de Deus, tanto perante todas as tentativas de adaptação e de adulteração, como diante de qualquer oportunismo.