AGRADECIMENTOS:
A Deus, pela família que me deu,
À minha família
À Mônica, minha namorada e paciente companheira,
Ao Cristiano Goulart Schülter, o católico realista
Ao Daniel Pires, católico combativo
Ao Padre Ricardo de Barros Marques, vigário da paróquia da Pompéia em Santos-SP, meu pai na fé,
Aos irmãos de Santos-SP, em especial o Gustavo Santos,
Ao Natan Oliveira, o primeiro a dizer que um dia eu seria católico,
Ao Daniel Siqueira, católico zoeiro,
Ao Gustavo Siqueira, por ser meu irmão na fé, catequista e amigo nas dificuldades comuns,
Ao Fábio Salgado de Carvalho, pelo testemunho brilhante da sua conversão,
Aos ateus da Internet, em especial o Camilo Caetano, que me levaram a estudar meticulosamente o Cristianismo,
A todos que me mostraram quão pouco eu sabia.
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“Não existem cem pessoas que odeiam a Igreja Católica, mas existem milhões que odeiam aquilo que pensam ser a Igreja Católica.”(Venerável Arcebispo Fulton Sheen)
“A Igreja é o Corpo de Cristo, uma entidade estruturada. É concreta, não é uma nuvem de gás. O Corpo é visível. O modelo é Jesus, que teve um Corpo visível durante 33 anos. Além do mais, como era no princípio? (…) Havia somente uma Igreja! (...) Nós precisamos do que Jesus colocou na Igreja Católica. Eu preciso dos sacramentos, eu preciso do Magistério, preciso do Papa, preciso da tradição que preservam. Eu preciso da Igreja para minha própria salvação” [1]
“"É impossível ser justo com a Igreja Católica. No momento em que o homem cessa de atacá-la, ele sente uma atração em direção a ela. No momento em que ele cessa de gritar, ele começa a ouvi-la com prazer. No momento em que ele tenta ser justo ele começa a admirá-la."(G. K. Chesterton[2])
Este é o relato dos motivos da minha conversão ao Catolicismo. Não é um tratado de Teologia nem uma tentativa para converter alguém. Escrevi este relato para organizar meus pensamentos e facilitar quando perguntarem os motivos da minha conversão. No decorrer do texto indiquei vários livros ao leitor interessado em compreender os motivos que me levaram a tomar a decisão de seguir a Igreja Católica Apostólica Romana. Ao final do texto eu proponho um roteiro de leituras para entender a fé católica e examinar as acusações que fazem à Igreja.
AVISO: Peço que leia os livros recomendados, em especial aqueles destacados em negrito, antes de tentar rebater as palavras aqui escritas. Não voltei para a Igreja por capricho ou comodismo; essa decisão custou muito esforço, oração e alguns sacrifícios. Esperar o mesmo do leitor é um ato de justiça. Quando o leitor discordar de algum ponto, o correto é buscar conhecer mais profundamente o que ensina a Igreja sobre o tema, o que dizem os grandes padres e apologistas católicos e então comparar com suas crenças. Aí sim o leitor poderá fazer um juízo sobre a fé. Só assim as suas palavras terão valor suficiente para serem ouvidas por mim. Ou como dizia um célebre e polêmico brasileiro: “Eu acho que o direito de ter opinião é proporcional ao interesse sincero que você tem pelo assunto. Se você não tem interesse pelo assunto para você sequer ler alguma coisa, por que nós devemos ter interesse de ouvir a sua opinião? ”[3]
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Sempre fui cristão. Fui batizado na Igreja Católica quando eu era um bebê. Por volta dos meus 06 anos, eu e minha família fomos para a igreja protestante. Desde então, minha família frequentou inúmeras denominações, quase todas tradicionais, e nunca mais tive contato com o catolicismo.
A Idade das Trevas
Com o advento do Facebook logo me envolvi em discussões com ateus[4]. Não tardou em aparecer o famoso argumento da Idade das Trevas: durante o período de mil anos entre 500-1500 a Igreja Católica oprimiu o Ocidente através do misticismo e da ocultação do conhecimento, além de perseguir oponentes por meio da Inquisição. Isto bastava para comprovar que a religião, especialmente o Cristianismo, está na contramão do progresso, da ciência e da liberdade individual.
Sendo cristão é meu dever conhecer e testemunhar a verdade. Então comecei a estudar a tal Idade das Trevas para verificar se a Igreja foi responsável por tamanha crueldade. Pobre de mim! Descobri que aconteceu exatamente o contrário: num milênio de caos, fragmentação política, invasões de povos selvagens e peste, a Igreja foi a única instituição ocidental a manter-se estável, um verdadeiro porto seguro. O conhecimento da época dos gregos e romanos foi preservado através de muito trabalho dos clérigos católicos, como por exemplo os monges copistas, responsáveis por copiar livros inteiros à mão. Em vez de combater a ciência, a Igreja foi por muitos séculos a única instituição a fomentar o desenvolvimento científico na Europa. Ela foi a criadora das universidades, seus clérigos traduziram muitas obras da época romana e grega, além de permitir que debates acalorados com pensadores de outras culturas acontecessem dentro das suas universidades.[5]
Quanto à famosa Inquisição minha surpresa foi ainda maior: aproximadamente 2000 pessoas foram condenadas à morte pelos Tribunais da Inquisição medievais (1231-1400 dC). Durante as inquisições da Espanha e Portugal, as mais violentas, 6000 pessoas morreram nos 500 anos de duração dos tribunais eclesiásticos ibéricos. Considerando a população ibérica e europeia nos níveis da Idade Média (bem baixos, o que aumentará a proporção que mostrarei a seguir, de forma a mostrar ao leitor o “pior caso” da Inquisição), temos que a pior inquisição, a ibérica (de Portugal e Espanha) condenou à morte 17 pessoas a cada 100 mil habitantes, por ano. A inquisição medieval, mais branda, condenou à morte 0,08 pessoa a cada 100 mil habitantes, por ano.[6] Só para comparar, no Brasil 22 a cada 100 mil habitantes morreram em acidentes de trânsito e 2,55 pessoas a cada 100 mil habitantes morreram por afogamento.[7]
O historiador protestante Phillip Schaff afirma: “Para vergonha das igrejas protestantes, a intolerância religiosa e até a condenação à morte continuaram muito tempo depois da Reforma. Em Genebra esta perniciosa teoria foi posta em prática pelo estado e pela igreja, admitindo até mesmo o uso de tortura e do testemunho de crianças contra seus próprios pais, com a autorização de Calvino. Bullinger, na Segunda Confissão Helvética, anunciou o princípio pelo qual a heresia poderia ser punida como os crimes de assassinato ou traição.”[8]
Não se trata da tática de justificar um erro apontando o erro dos outros. Tortura é inaceitável sob qualquer ponto de vista. No entanto, devemos ser justos e agir com a mesma rigidez no caso dos morticínios realizados por outros grupos, como os protestantes (veja o caso dos Anabatistas e a caça às bruxas - fenômeno exclusivamente protestante), islâmicos (preciso comentar?) e ateus - durante a Revolução Francesa, que nos ensinam ter sido fundamentada nos princípios de “Igualdade, Liberdade e Fraternidade”, foram mortas 140 mil pessoas em cinco anos[9]. Quer dizer, uma revolução de cunho ateu matou 100 pessoas a cada 100 mil habitantes por ano, matando 05 vezes mais gente do que a pior inquisição (só para constar, no Brasil morreram 28 pessoas a cada 100 mil habitantes por homicídio em 2013 - a Revolução Francesa matou 03x mais que os criminosos brasileiros).
Para encerrar este assunto, a própria Igreja admitiu os abusos cometidos na Inquisição. Tanto que ela abriu os arquivos da Inquisição a um grupo de 30 historiadores reconhecidos internacionalmente, para que eles investigassem os fatos. [10]
Estudando a Fé
Este estudo sobre o papel essencial da Igreja Católica na Idade Média fez com que eu a admirasse. Mas isso era só o começo.
No início de 2015 decidi então conhecer a fé católica. Se o papel histórico da Igreja Católica na Idade Média foi muito diferente do que me ensinaram, será que a fé católica não me surpreenderia também? Isto eu precisava conferir.
Escolhi livros que explicassem a fé católica ao público protestante e testemunhos de conversões de protestantes ao catolicismo. Eu li estes: Catholicism for Protestants– Shane Shaetzel, Rome Sweet Home– Scott e Kimberly Hahn (encontrado no Brasil sob o título Todos os Caminhos levam a Roma), Born Fundamentalist. Born Again Catholic– David Currie, e A Fé Explicada– Pe. Leo J. Trese. Todos os conceitos mencionados daqui em diante foram exaustivamente explicados nesses livros.
Da minha experiência pessoal, creio que os principais problemas dos protestantes/evangélicos com o Catolicismo são a veneração dos santos e de Maria. Existem outros pontos de conflito, mas estes dois são os primeiros que surgem à mente do protestante comum;
Naturalmente, estes foram os primeiros problemas que procurei por explicações. Trata-se da Intercessão dos Santos. Por que o católico reza a Maria e aos santos? Isso não é idolatria? Não. O católico não considera a oração uma forma de adoração. Da mesma forma que pedimos oração a outros irmãos da igreja, o católico pede oração a pessoas que viveram vidas extraordinárias aqui e que agora estão vivas no Céu, diante de Deus.
Especificamente no caso de Maria, a mãe de Deus, creio que grande parte do problema protestante se resolva ao compreender como os católicos entendem a Intercessão dos Santos. Só resta acrescentar que ao católico é dogma de fé que Maria é a criatura mais santa dentre todas as criaturas de Deus. Os motivos dela ser assim considerada estão nos documentos da doutrina católica, e o estudo das doutrinas marianas chama-se Mariologia. Temos então o seguinte raciocínio:
1) A oração dos santos é mais eficaz[11]porque eles estão em plena comunhão com Deus, no Céu.
2) Maria é a mais santa dentre todos os santos. Além disso, tem ligação íntima com Cristo, a ligação entre mãe e filho.
3) Logo (aceitas as premissas 01 e 02), é razoável pedir que Maria interceda por mim diante de Cristo.
Ao entender isto, fica fácil entender também porque os católicos devotam tantas orações e cerimônias aos santos em geral e à Maria em particular. Eles não acreditam que os santos são deuses e sim que os santos, hoje no Céu, são excelentes intercessores dos simples cristãos que estão aqui. Recomendo ler o que ensina oficialmentea Igreja a respeito de Maria.[12]
O último conceito que é útil estudar para entender os católicos neste assunto dos santos é a diferença entre adoração e veneração. Adoração é o culto prestado unicamente a Deus. Assim como na Bíblia, o católico acredita que não existe verdadeira adoração sem oferecimento de sacrifício, que é o que acontece na Missa. O católico só oferece sacrifícios a Deus. Já a veneração é uma forma de prestar homenagem, uma demonstração pública de respeito. Da mesma que homenageamos grandes personalidades políticas, artísticas ou dos negócios, o católico homenageia, dentro do contexto cristão, aqueles que viveram vidas exemplares.
Ao contrário do que muitos pensam, a Igreja tem 2 mil anos de idade e já estudou profundamente os Mandamentos de Moisés, em especial os dois primeiros (sobre a idolatria e imagens).[13]
Então, a meu ver, se é ilícito venerar os santos e encomendar-lhes orações, então é muito mais ilícito homenagear qualquer pessoa desta terra, ou pedir que algum irmão ore por mim. Se os santos, que viveram unicamente para Cristo, são indignos de homenagem, quão dignos seremos nós, meros mortais que não conseguem passar 01 dia se sacrificando por Deus?
Alguns dizem que essa veneração aos santos diminui a glória devida a Deus. De forma alguma! Os santos só são lembrados por suas vidas heroicas porque Deus os ajudou com as graças necessárias para tanto. A diferença dos santos e de nós, meros mortais, é que eles responderam ao chamado de Deus de forma mais perfeita. Ou seja, a glória dos santos é a glória de Deus.[14]
Existem muitos bons livros dedicados a explicar a devoção mariana, seu surgimento e desenvolvimento na História e porque ela não é uma forma de idolatria. Recomendo três livros que tratam toda essa questão num único volume: Behold your Mother- Tim Staples (aqui); Mary, Mother of the Son- Mark Shea (aqui) e The Marian Mystery: Outline of a Mariology- Denis Farkasfalvy (aqui). Estes livros demonstram que já nos primeiros séculos de Cristianismo havia devoção à Mãe de Deus.
Do motivo de não continuar protestante
Entender essas práticas católicas serviria apenas para desmistificar minha visão do catolicismo. Eu já começava a ser justo com a Igreja. No entanto, somente quando estudei e refleti sobre 02 assuntos que não costumam ocupar o primeiro lugar na lista de problemas dos evangélicos com os católicos que fiquei numa posição insustentável, levando-me a tomar a decisão sobre minha fé.
O principal fundamento teológico do Protestantismo, isto é, de todas as denominações não-católicas que surgiram a partir do ano 1500 é o Sola Scriptura. Este princípio ensina que “somente a Escritura é a suprema autoridade em matéria de vida e doutrina; só ela é o árbitro de todas as controvérsias”[15]. É ele que justifica a famosa pergunta dos evangélicos “onde isso está na Bíblia?” Esta é a pergunta que os católicos mais escutam dos protestantes.
O grande problema com o Sola Scriptura é que ele mesmo não é bíblico. Você leu isso mesmo. O princípio que afirma que a Bíblia é a única autoridade em matéria de fé não é bíblico. Não precisa acreditar em mim. Procure na Bíblia. Pergunte a qualquer teólogo protestante em qual parte da Bíblia está o Sola Scriptura. Ele não saberá responder[16]. O que me deixou mais chocado foi descobrir que o Sola Scriptura é simplesmente aceito um axioma, uma ideia que não precisa de provas (é irônico os protestantes acusarem os católicos de dogmáticos quando a base da crença protestante é o dogma sem fundamento).E isso não sou eu quem diz: “Existem evidências internas e externas da inspiração e divina autoridade das Escrituras, mas estes atributos não são passíveis de "prova". A única evidência que importa é o “testemunho interno do Espírito” no coração do leitor. Ênfase de Calvino: "A menos que haja essa certeza [pelo testemunho do Espírito], que é maior e mais forte que qualquer juízo humano, será fútil defender a autoridade da Escritura através de argumentos, ou apoiá-la com o consenso da Igreja, ou fortalecê-la com outros auxílios. A menos que seja posto este fundamento, ela sempre permanecerá incerta" (8.1.71). ”[17]. Ou seja, a “prova” que uma interpretação particular da Bíblia é inspirada por Deus é uma “certeza maior e mais forte que qualquer juízo humano”. Basta se sentir certo para estar certo. Já pensou fazer isso num vestibular?
Tome a seguinte afirmação: “Não existe verdade”. Quando alguém afirma isso já se contradiz, porque essa mesma frase é em si mesma uma verdade. Na verdade, o que a pessoa quis dizer é: “Não existe verdade – exceto esta aqui”. É um princípio arbitrário, afinal, só é verdade porque quem o enuncia diz que é verdade. Um princípio falho em si mesmo não pode ser verdade. É o mesmo problema do Sola Scriptura.
O Sola Scriptura não encontra fundamentação bíblica e também histórica. Os cristãos primitivos, aqueles que viveram nos primeiros 300 anos depois de Cristo, nunca pronunciaram o Sola Scriptura, pelo contrário. Todos acreditavam na necessidade de existir uma autoridade central, outorgada pelo próprio Cristo, para interpretar as Escrituras. Um exemplo famoso (mas não o único) é o de Santo Agostinho: “Eu não acreditaria no Evangelho, se a isso não me levasse a autoridade da Igreja Católica”[18]. Não há nenhum registro dos primeiros cristãos afirmando que as Escrituras são a única e suprema autoridade na fé, e você verá o motivo logo abaixo.
Nos primeiros 300 anos de Cristianismo não existia Bíblia. É isso mesmo. O cânon, o conjunto dos livros cristãos que formaram a Bíblia, só foi definido entre 367-405 dC[19](curiosamente, até um historiador protestante reconhece estas datas[20]). Durante todo esse período em que não existia uma Bíblia, qual foi a autoridade suprema dos cristãos em matéria de fé? E pior: até a invenção da imprensa em 1455 pouquíssimos livros estavam em circulação, porque eram de difícil produção. Assim, a quem os cristãos podiam recorrer durante 1400 anos, já que poucos deles tinham os meios de acesso às Escrituras?
Além disso, “pelos frutos os conhecereis”: hoje existem milhares de denominações protestantes [21], e cada uma delas alega possuir a “verdadeira interpretação” das Escrituras. Quem está falando a verdade? Qual é a verdadeira fé e a verdadeira igreja? Qual o modo correto de interpretar a Bíblia? O que vale pra hoje e o que não vale mais?
Para ilustrar a fragilidade do Sola Scriptura, permita-me elencar 05 pontos levantados neste vídeo:
1) Onde a Bíblia diz que eu devo provar alguma coisa pela Bíblia?
2) Por que a minha interpretação da Bíblia (em meu caso, fundamentando a doutrina católica) está errada e a sua correta? Eu também estou me guiando pela Bíblia, nós só discordamos no que ela quer dizer.[22]
3) Talvez você não está compreendendo o significado correto da Bíblia. Um exemplo: se eu lhe escrever o seguinte bilhete: “Eu não disse que você roubou dinheiro”, você conseguiria entendê-lo? Parece que sim, mas uma frase de 07 palavras pode ter vários significados. Pode ser que EU não disse que você roubou dinheiro, mas alguém disse. Pode ser que eu não DISSE, mas posso ter escrito ou pensado que você roubou dinheiro. Pode ser que eu não disse que VOCÊ roubou dinheiro, posso ter falado de outra pessoa. Pode ser que eu não disse que você ROUBOU dinheiro, você pode ter perdido ou queimado dinheiro. Pode ser que eu não disse que você roubou DINHEIRO, você pode ter roubado outra coisa. Uma simples frase de 07 palavras tem pelo menos cinco significados diferentes, a depender da ênfase dada a cada palavra. Agora me responda: não é a Bíblia muito mais complicada que uma frase de 07 palavras?
4) O que está em confronto não é o que a Bíblia ensina, mas o que nós interpretamos da Bíblia.
5) De onde vieram os livros do Novo Testamento? Como eles foram parar na Bíblia? Quem afirma rejeitar a Tradição porque segue apenas a Bíblia não pode fazer isso, porque foi a própria Tradição católica quem escolheu quais livros pertencem ao Novo Testamento. Em lugar algum a Bíblia diz quais livros fazem parte dela. Então, o simples fato de ser “biblista” só é possível graças à Tradição católica.
A Bíblia não caiu do Céu. Durante quase 400 anos os cristãos lutaram para reconhecer, aos poucos, os livros inspirados, até que concílios católicos, compostos por bispos católicos, definiram os livros da Bíblia. Foi a autoridade da Igreja que encerrou a discussão sobre os livros inspirados.
Então, para encerrar este assunto, o Sola Scriptura: não é bíblico, não é lógico, não é histórico e teve consequências catastróficas para o Cristianismo. Foi um conceito inventado depois de 1500 anos de Cristianismo. Sendo assim, é no mínimo questão de prudência considerar que a posição católica (de acreditar na autoridade da Bíblia, mas também na da Tradição conservada pela Igreja Católica) é plausível. Não estou pedindo para você se converter, apenas para reconhecer que não é absurdo a Palavra de Deus não se restringir a um livro. Isto é o mínimo que se espera de alguém honesto.
Ademais, o problema do Sola Scriptura é discutido exaustivamente por muitos autores católicos. Vale a pena constatar que o “só vale o que está na Bíblia” não é novo nem surpreende os católicos.[23]
Diante de tudo isso, eu não podia mais aceitar o fundamento do Protestantismo, o Sola Scriptura. A Bíblia sozinha não é suficiente para resolver todos os conflitos da vida cristã. Simplesmente havia coisas demais que eram “deduzidas” (eu prefiro dizer “inventadas”) no calor do momento de uma época. Isso sem mencionar que a Bíblia é uma coleção de livros complexa demais para que um fiel comum, sem condições de estudar grego, latim, hebraico, aramaico, filosofia e teologia, pudesse interpretar de forma mais correta que o corpo de toda a Tradição cristã de 2 mil anos. Seria muita arrogância. Foi nesse momento que eu, pelo menos em consciência, deixei o Protestantismo.
Roma, Lar Doce Lar
Deixar o Protestantismo e todas as denominações protestantes é uma coisa. No entanto, faltava um motivo claro e inegável para eu escolher a Igreja Católica. Este motivo foi a Eucaristia.
A Eucaristia é centro de toda a fé católica. Com muita distância, parece com a “Santa Ceia” dos protestantes, porém muito mais carregada de sentido e importância: o católico acredita que na Eucaristia o pão e o vinho se transformam, milagrosamente, no corpo e no sangue de Cristo. Assim, podemos dizer com razão que o católico “absorve” o próprio Cristo, presente de maneira real na celebração da Eucaristia. Loucura? Canibalismo? Essas acusações não são novas.
No Evangelho de João, capítulo 06, o próprio Cristo profere estas palavras: “Na verdade, na verdade vos digo que, se não comerdes a carne do Filho do homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis vida em vós mesmos. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia. Porque a minha carne verdadeiramente é comida, e o meu sangue verdadeiramente é bebida. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele. Assim como o Pai, que vive, me enviou, e eu vivo pelo Pai, assim, quem de mim se alimenta, também viverá por mim.” (João 6:53-57). Logo em seguida, pela primeira vez em seu ministério, Jesus perde discípulos por causa de um ensinamento. Eles consideraram essas palavras de Jesus “muito duras” (vs 60).
A resposta de todo protestante é alegar que Jesus disse essas palavras no sentido figurado[24], isto é, comer a carne e beber Seu sangue seria um símbolo. O problema com essa versão é que ela faz de Jesus um insensível que gostava de induzir seus seguidores ao erro e à blasfêmia. Explico.
Em todo o Evangelho (nos 04 livros, Mateus, Marcos, Lucas e João) Jesus Cristo fez questão de explicar o significado de suas palavras quando falava por meio de linguagem simbólica, ou em parábolas. Veja no caso do “nascer de novo” a Nicodemos (João 3) e em todas as parábolas (semeador, joio e trigo, videira, talentos, etc.). Jesus Cristo, sendo Deus, não pode induzir outros ao erro, ao pecado gravíssimo da blasfêmia. No entanto, justamente no caso da Eucaristia, Ele se calou. O único cenário que justifica Jesus permitir que vários dos seus discípulos O abandonassem é por ter dito exatamente o que Ele quis dizer. Não há forma mais clara de dizer que deveríamos beber Seu sangue e comer Sua carne.
Além da evidência do próprio Cristo, há a evidência histórica: já os primeiros apóstolos, e seus primeiros sucessores, acreditavam que Jesus estava realmente presente no pão e no vinho da Ceia. É por isso que Paulo fez a famosa advertência em 1 Coríntios 11:29: “Porque o que come e bebe indignamente, come e bebe para sua própria condenação, não discernindo o corpo do Senhor.” É pecado grave participar da Ceia sem discernir ali o corpo de Cristo.[25]
Os protestantes insistem em dizer que a Ceia é apenas um memorial, uma cerimônia para lembrarmos de Cristo, e que consequentemente o pão e o vinho são símbolos de Cristo. No entanto, os primeiros cristãos já igualavam o corpo de Cristo na Cruz ao corpo de Cristo na Eucaristia[26] Tornar o corpo de Cristo na Ceia simbólico é tornar a Crucificação simbólica.
Essas e outras provas a favor da Presença Real de Cristo na Eucaristia estão muito bem explicadas nos livros que eu grifei no meio deste relato. [27]
Sabendo que o Cristo, capaz de sofrer uma morte cheia de torturas por nós, não seria capaz de perder discípulos por causa de uma confusão de palavras, eu não tenho motivos para acreditar em outra coisa que não seja o sentido literal das palavras de Jesus: que precisamos comer Sua carne e beber Seu sangue para ter vida em nós. E conhecendo que na Igreja Católica eu poderei participar do banquete do próprio Cristo, o Noivo, o Cordeiro, e que Ele, Deus encarnado, encontra-se fisicamente presente na Santa Missa, somente o orgulho obstinado poderia servir de motivo para não me render à Igreja Católica Apostólica Romana.
O que mais eu deveria fazer se soubesse que Jesus Cristo está fisicamente presente em algum lugar?
“E eis que estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos.” (Mateus 28:20)
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Este é o breve relato dos motivos da minha conversão ao Catolicismo. Não tenho a intenção de torná-lo um tratado religioso ou histórico sobre a fé católica e, por essa razão, não tratei de outros temas de conflito com protestantes. Pra isso existem centenas de (bons) livros, e eu posso indicar alguns ao leitor interessado e honesto, o primeiro deles é o “manual” católico, o Catecismo da Igreja Católica. Por fim, que estas palavras sejam acolhidas em terreno fértil, para que produzam muitos frutos para a glória de Deus, nosso Pai.
Em Cristo Jesus Nosso Senhor,
Olímpia, São Paulo, 28.07.2015
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Atualizei o relato com novas fontes de consulta hoje, 20/11/2015.Enfatizei o Catecismo da Igreja porque ali está a doutrina oficial da Igreja Católica, explicada de forma simples, com muitas referências à Bíblia (!) e aos cristãos primitivos. Se todos consultassem o que a Igreja ensina de verdade muitas dúvidas e acusações não existiriam.
Proponho um roteiro de leituras para entender o que ensina a Igreja Católica, e conhecer a “visão do outro lado” diante de tantas acusações (desde idolatria até conspiração contra o progresso). Espero que estes livros sejam apenas o início das suas investigações para descobrir qual é a Igreja que Cristo fundou.
1. Catecismo da Igreja Católica
2. Respondendo dúvidas protestantes: As diferenças entre a Igreja Católica e as evangélicas- Jaime Moura (aqui), Em defesa da fé católica nas questões mais difíceis- Alessandro Lima (aqui) e o excelente (foi o primeiro livro sobre a fé católica que eu li) Catholicism for Protestants-Shane Shaetzel (aqui). Neste livro o autor, católico bem no meio do Bible Belt (a região mais protestante dos EUA), responde de maneira curta, organizada e dentro da doutrina católica às dúvidas levantadas pelos protestantes. É um excelente material para começar a remover preconceitos sobre a Igreja.
3. História da Igreja: Coleção História da Igreja- Daniel-Rops (10 volumes, aqui), além dos livros já citados no meio do relato.
4. Testemunhos de convertidos à Igreja Católica: eu sempre achei que só pessoas burras ou desonestas permaneceriam ou se converteriam à Igreja Católica. Estava redondamente enganado. E foi só depois que eu saí do meio é que percebi como a grande maioria dos protestantes ainda pensa isso dos católicos. Espero que estes livros ajudem a desmistificar a noção que têm dos católicos. Porque estes protestantes se tornaram católicos- Jaime Moura (aqui); Todos os caminhos levam a Roma- Scott e Kimberly Hahn (aqui); Surprised by Truth: 11 Converts Give the Biblical and Historical Reasons for Becoming Catholic (aqui); Surprised by Truth 2: 15 Men and Women Give the Biblical and Historical Reasons For Becoming Catholic (aqui); Surprised by Truth 3: 10 More Converts Explain the Biblical and Historical Reasons for Becoming Catholic (aqui), toda a série de autoria do Patrick Madrid; o testemunho brilhante da conversão do Fábio Salgado à Igreja (cheio de dicas de livros, aqui); Lista de 201 ex-protestantes conversos ao Catolicismo (aqui); Todos os membros da Igreja Cristã Maranatha (Detroit) se convertem ao Catolicismo (aqui e aqui);. Com esses testemunhos espero que o leitor entenda que pessoas com motivos sérios, fundamentados, e com uma prática de vida piedosa, escolheram a Igreja Católica. Não é uma escolha por conveniência, malícia ou ignorância. Muitas dessas pessoas perderam amigos, familiares e todo seu círculo social de uma vida inteira quando escolheram a fé católica. Todos eram cristãos estudiosos, inteligentes, conhecedores da Bíblia e ativos na vida ministerial das suas igrejas. Se meu exemplo não basta, espero então que o exemplo destes irmãos em Cristo o ajude a perceber que a fé católica não é uma mentira ou tradição de homens
5. Católicos que mudaram de vida: uma das perguntas que me fizeram é porque é tão difícil ver um católico que muda de vida. Bom, quando estudamos Arquitetura ou Engenharia Civil não começamos pelos prédios que caíram, mas por aqueles que estão firmes até hoje. O mesmo vale para o estudo dos católicos: estuda-se primeiro aqueles que viveram a fé de forma mais perfeita e correta. Estes são os santos. Leia algumas biografias dos santos como: Saints Behaving Badly: The Cutthroats, Crooks, Trollops, Con Men, and Devil-Worshippers Who Became Saints- Thomas Craughwell (aqui); Os Santos que Abalaram o Mundo- Rene Fullop Miler (aqui); Padre Pio - Um Santo entre Nós- Renzo Allegri (aqui); História de uma Alma - autobiografia de Santa Terezinha do Menino Jesus- aqui.
6. Material extra: eu recomendo vivamente o site Católicos Online e sua seção com fantásticos testemunhos de conversão e o site do Padre Paulo Ricardo como fonte da doutrina oficial católica. Nestes há vários vídeos respondendo dúvidas comuns dos cristãos protestantes, além de aulas e cursos voltados aos católicos, para crescimento em santidade e conhecimento da fé[28]; o site do Veritatis Esplendor e o site do Apologistas Católicos. Entre os apologistas católicos que acompanho, quase todos ex-protestantes, quero destacar dois (os outros você encontrará na lista do Fábio Salgado): Scott Hahn e Dave Armstrong. Leia tudo que puder desses autores. O primeiro tem alguns livros traduzidos (encontrados aqui). O segundo é especialista em demonstrar os fundamentos bíblicos do Catolicismo (veja o site dele). Acho muito interessante seus 150 motivos porque sou católico (estão resumidos, então se você discorda de alguns pontos, busque se aprofundar no assunto - no site dele, em livros, etc).
[1] Durante o culto dominical, Ulf Ekman anunciou diante dos 3 mil fiéis da sua igreja, que ele e sua esposa se converteram ao Catolicismo. Veja mais aqui.
[2] Do livro The Catholic Church and Conversion, citado neste artigo: https://www.sociedadechestertonbrasil.org/resenha/a-igreja-catolica-e-conversao/
[3] Olavo de Carvalho, em seu programa True Outspeak – 10.03.2008
[4] eu prefiro chamá-los “neoateus”, por fazerem parte de uma geração recente de ateus militantes e superficiais cujo maior “guru” é Richard Dawkins, mas tem entre seus expositores famosos Neil deGrasse Tyson, Sam Harris e Christopher Hitchens.
[5] Essas e outras contribuições da Igreja Católica ao mundo ocidental estão cuidadosamente listadas no livro Como a Igreja Católica construiu a Civilização Ocidental, de Thomas Woods Jr.
[6] A estimativa de vítimas da Inquisição foi retirada daqui e a estimativa da população europeia medieval daqui.
[8] Trecho livremente traduzido do seu livro History of the Christian Church” (vol. V, New York, 1907, p. 524)
[9] Considerei as mortes do Período do Terror e da Revolução da Vendeia. Dados da Enciclopédia Encarta - acesso em 22/02/2016.
[10] Todos esses fatos sobre a inquisição católica estão documentados em vários livros, entre os quais destaco: Atas do Simpósio sobre a Inquisição (1998) – Agostino Borromeo, A Idade Média que não nos ensinaram– Regine Pernoud, Sete Mentiras sobre a Igreja Católica– Diane Moczar.
[11] Tiago 5:16 diz que “a oração do justo pode muito em seus efeitos”
[12] parágrafos 963-975 do Catecismo, pra começar.
[13] O Catecismo faz um resumo (citando a Bíblia, como sempre) nos parágrafos 2129-2132.
[14] Um exemplo que ajuda a explicar a questão: quando elogiam a obra de um artista, ele não fica com inveja, pelo contrário, ele transborda de alegria. Os santos, da mesma forma, são obras de Deus.
[15] Fonte: https://www.mackenzie.br/6966.htmlacesso em 26.07.2015
[16] Na verdade, em 102% dos casos o protestante vai citar 2 Timóteo 3:16 (“Toda a Escritura é inspirada por Deus, e útil para ensinar, para repreender, para corrigir e para formar na justiça.”). Observe que o versículo não diz que apenas a Escritura é inspirada por Deus. Mesmo se fosse este o caso, teríamos que descartar todo o Novo Testamento, já que na época em que Paulo escreveu a Timóteo só existia o Antigo Testamento. E agora? Quem disse que o Novo Testamento é inspirado? Onde está a lista de livros que devem compor o Novo Testamento?
[17] Fonte: https://www.mackenzie.br/6966.htmlacesso em 26.07.2015
[18] Catecismo da Igreja Católica, 119
[19] Fonte: Enciclopédia Católica - acesso em 22/02/2016
[20] https://www.ccel.org/s/schaff/history/3_ch09.htm
[21] Na verdade são algumas centenas, se considerarmos “denominação” o conjunto de fiéis que segue a mesma doutrina ou tradição religiosa. Algumas pesquisas sobre a quantidade de denominações cristãs estão aqui: 33 mil denominações protestantes? Não! - acesso em 22/02/2016
[22] Chesterton disse: “ A Bíblia por si mesma não pode ser a base do acordo quando ela é a causa do desacordo. ”, no seu artigo “Por que sou católico”, traduzido aqui: https://angueth.blogspot.com.br/2007/04/por-que-sou-catlico.html
[23] Alguns livros que eu recomendaria a quem deseja saber como o católico trata esse princípio seriam estes: Not By Scripture Alone– Robert Sungenis (uma verdadeira bomba atômica contra o Sola Scriptura), e 100 Biblical Arguments Against Sola Scriptura– Dave Armstrong.
[24] No contexto bíblico, o único significado figurado(ou simbólico) de “comer a carne” e “beber o sangue” de alguém é “aniquilar alguém por ódio”. Claramente não é o contexto da fala de Jesus.
[25] Por que seria um pecado tão grave participar indignamente de um “memorial”?
[26] Carta de Inácio (35-107dC) aos Esmirnenses, parágrafo 7: “ Abstêm-se eles da Eucaristia e da oração, porque não reconhecem que a Eucaristia é a carne de nosso Salvador Jesus Cristo, carne que padeceu por nossos pecados e que o Pai, em Sua bondade, ressuscitou. ”. A tradição conta que ele foi o 3° bispo de Antioquia e discípulo do Apóstolo João. Citação extraída de: https://www.apologeticacatolica.com.br/agnusdei/inesm0.htm
[27] Além deles, o melhor livro sobre esse assunto provavelmente é O Banquete do Cordeiro– Scott Hahn.
[28] O Pe. Paulo Ricardo está apresentando um curso sobre Protestantismo. Ele pode ser assistido aqui.
Fonte: https://www.pr.gonet.biz/kb_read.php?pref=htm&num=3922