Maria é a mulher do Gênesis, do Apocalipse, das Bodas de Caná e dos pés da cruz
Tenho certeza que você reparou no Evangelho de hoje, quando Maria foi até Jesus para Lhe dizer que o vinho havia acabado. O Senhor disse que sabia desse fato. O que nos chama à atenção é Jesus chamar Maria de mulher. Se observarmos no livro do Gênesis, veremos que ele fala da inimizade entre a serpente e a mulher.
Quando Jesus chama Maria de mulher, está dizendo que ela é a mulher do Gênesis, a prometida que esmagaria a cabeça da serpente. Isso me facilitou, abriu o caminho para que entendesse as vezes que Jesus a chama assim. Houve outra situação em que Jesus a chamou de mulher, quando Ele estava na cruz e Ele a entregou a João: “Mulher, eis aí teu filho”. Com isso ele está dizendo: “Mulher, assim você está esmagando a cabeça da serpente”.
Depois, fui verificar que, no livro do Apocalipse, Maria também é chamada de “mulher”. Esse foi o triunfo da mulher do Gênesis, aquela que tem a vitória junto a Jesus.
Maria é a mulher do Gênesis, do Apocalipse, das Bodas de Caná e dos pés da cruz. Nós também podemos chamá-la de ‘mulher’ como Jesus a chamou.
Maria é a Mulher por excelência
O estudo da Bíblia nos põe diante de verdades que precisam de reflexão. Até porque, sendo um livro eterno, das Sagradas Escrituras é possível tirar lições que ajudam a superar problemas atuais. Porém, alguns trechos trazem mais dúvidas que soluções, quando analisadas sem profundidade, ou apenas com a primeira impressão. Um deles é o milagre em Caná, Galileia, quando Jesus transformou a água em vinho. Em uma de suas passagens, Nossa Senhora vai até seu Divino Filho solicitar ajuda para os esposos, ao qual Cristo responde: “Mulher, que tenho eu contigo? Ainda não é chegada a minha hora” (Jo 2, 4). Qual a razão desta “fala truncada” de Jesus? Por que chama Maria de Mulher? É o que analisaremos hoje.
Na Bíblia, precisamos respeitar o contexto
Já diz o ditado popular: “Todo texto fora de contexto é pretexto”. Assim, quando lemos as Sagradas Escrituras, precisamos sempre nos reportar ao período, aos costumes e ao idioma dos hebreus do século em questão. Também nesta passagem, da transformação da água em vinho, é necessário lembrarmo-nos desta verdade.
Em primeiro lugar, o aramaico, língua falada pelos hebreus das classes mais populares, tinha uma forma de escrever diferente da nossa. Para eles, não havia a representação escrita de vogais, mas apenas consoantes, pois a forma de flexionar estas consoantes era apenas na fala. É por isso que muitos papiros antigos da região hebraica sofrem de difícil compreensão, já que temos sequências de consoantes que são as mesmas, mas que poderiam dizer de três a quatro coisas diferentes, pois dependeriam das vogais não escritas.
Maria, por exemplo, vem do nome hebraico Miriam, e seu modo de escrever, colocando para nossa língua, seria MRM. E assim também Mulher, que tem as mesmas consoantes, em hebraico, da palavra Mãe. Qual Jesus terá usado, de fato? Não sabemos, pois os que o ouviram falar foram apenas os daquela festa.
Por outro lado, não só a grafia, mas o simbolismo e adequações das palavras mudam com o passar do tempo. Para nós, a palavra mulher pode soar meio rude, como se se quisesse distância, mas para os hebreus não: o título “mulher”, dito por um parente, queria dizer: “minha senhora”, “minha querida”. Alguns desses significados podem ser observados em outros livros da Bíblia, tais como Reis, quando Davi se refere a Abigail, ou Samuel, quando o cronista narra a gravidez da mãe do profeta Samuel, e ainda em Ester, quando Mardoqueu, seu tio, vem visita-la após esta ser escolhida como rainha.
Jesus chama Maria de Mulher com um significado mais profundo
Além de todas estas características, que inevitavelmente precisam ser levadas em consideração ao meditarmos tal passagem, também é preciso lembrarmos que Bíblia é um Livro Sagrado, inspirado pelo Espírito Santo e que possui verdades em suas entrelinhas, para que novos tesouros possam ser retirados. Esta passagem em questão, quando Jesus chama Maria de Mulher, traz um significado ainda mais profundo.
No gênesis, após Adão e Eva serem intimados por Deus de seu pecado, o Senhor dá a eles um castigo pela falta: é o pecado original e sua consequência em toda a humanidade. Recebemos o trabalho como uma forma de punição e uma forma de reparação, além da dor do nascimento, na forma do parto, e o final castigo, a morte.
Tendo dado tais sentenças, Deus se volta à cobra. Não mais ao animal, que recebeu também seu veredito, rastejar sobre o ventre, mas ao demônio, o autor da tentação e eterno atrapalhador da salvação. Vemos no versículo 15, capítulo 3: “E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua semente e a sua semente; esta te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar”.
Quem é a mulher a quem Deus põe inimizades? É Jesus quem nos conta: “Filho, eis aí tua Mãe. Mulher, eis aí o teu Filho” (Jo 19, 26-27). O episódio nas bodas de Caná foi mais uma forma de Cristo nos contar que a Mulher da profecia é a Santíssima Maria. É Ela quem pisa a cabeça da Serpente, como vemos na imagem de Nossa Senhora das Graças.
E como se não bastasse isso, vemos que São João, o mesmo escritor do evangelho que estamos acompanhando, descreve também no Apocalipse: “vi uma Mulher vestida de Sol, com a Lua sob os pés, e, à cabeça, uma coroa de doze estrelas” (Ap 12, 1). Mais uma vez a passagem simbólica de Maria que é identificada como a Mulher.
E a “fala truncada” de Jesus?
Tendo explicado o porquê de Jesus chamar Maria de Mulher no Evangelho, cabe ainda uma dúvida: qual a razão de Cristo falar “que tenho eu contigo?” Não era sua Mãe quem conversava com Ele? Seria uma “grosseria” de Jesus tal passagem? Ou ainda, como gostam de dizer alguns protestantes, um sinal de que não devemos recorrer a Mãe de Cristo, já que é assim que Ele a trata?
Devemos sempre, numa reflexão de fé, lembrarmo-nos de quem estamos falando. Jesus é Deus, Segunda Pessoa da Santíssima Trindade; Ele não pode pecar, não pode cometer uma grosseria. Assim, tendo estabelecido um primeiro limite, nos perguntamos: por que, então, essa observação que passou para o futuro transcrita nos Evangelhos?
Os santos dizem que São João acrescenta isso em seu Evangelho para ficar patente o poder da intercessão de Nossa Senhora. Esta pergunta: “o que tenho eu contigo”, fica perfeitamente respondida quando Maria Santíssima diz aos serventes: “fazei o que Ele vos disser”, pois, mesmo não sendo a hora de Jesus, Ele faz o seu primeiro milagre, em atenção ao desejo de sua Mãe.
Tanto quando Jesus chama Maria de Mulher, quanto quando pergunta o que tem a ver com ela, são formas eficientes de ilustrar, para aqueles que tem fé, a soberania da Virgem. Não era de se esperar outra conduta do Filho Perfeito. Aliás, todas as considerações de carinho que imaginamos de Cristo com Nossa Senhora são infinitamente inferiores ao verdadeiro amor e dileção que Ele tem por sua Mãe. Que aprendamos, então, do Sagrado Redentor, o amor perfeito a Maria Santíssima.
Peçamos que a Mulher do Gênesis ao Apocalipse interceda por seu encontro pessoal com Jesus. Se você já o teve, que ela interceda pela renovação e manutenção desse encontro.